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Palavaras
Às vezes, eu escrevo.
Sim, às vezes eu escrevo, sem pretensão, sem atenção, mas para tentar desenhar com palavras.
Os textos são escritos em português brasileiro e traduzidos para o francês.
(Re) Encontro
Sexta-feira. Noite. Lua. Estrelas. Ele olha para a cidade. Barulho noturno. Bares cheios, numa noite de verão. Ruas lotadas com pessoas conversando, rindo e bebendo. Ele passa pelos bares, esbarra nas pessoas no meio do caminho. Começa a correr. Atravessa a rua em meio aos carros buzinando. Para na outra calçada e olha para as pessoas nos bares. Olha para o céu. Olha para ele mesmo no reflexo de uma vitrine suja. Começa a caminhar rápido, sem parar nos faróis que se encontram no seu caminho.
Sexta-feira. Noite. Lua. Estrelas. Ela abre a janela da sala do seu apartamento e liga o rádio. Começa a dançar e cantar. Para. Vai até a janela e olha as pessoas na rua. Volta a dançar. Começa a chorar. Dança e chora, ao mesmo tempo. Canta em voz alta: “Melhor viver, meu bem, pois há um lugar em que o sol brilha pra você. Chorar, sorrir também e dançar...”. Pega um cigarro e vai até a janela, novamente. Fuma e chora. Volta a dançar voltada para a rua.
Ele anda mais depressa. O chão a sua frente está cheio de lixo. Tropeça numa sacola e cai. Olha para rua e para a calçada. Ninguém o ajuda. As ruas estão cheias. Ele volta ao seu caminho. Para e olha para os prédios daquele lugar. Prédios antigos, do século passado. Para em frente a um azul de três andares. A única janela aberta e com luz, entre aqueles prédios, era a do primeiro andar. Ele olha para a janela. Vê a imagem de uma mulher dançando. Fica observando.
Ela dança, agora sem chorar. Está na janela. A música acaba e ela olha para a rua. Vê a figura de alguém encarando a sua janela. Sorri e acena. Fecha a janela e sai pela porta. Passa pelo jardim do seu prédio, cheio de flores coloridas e pequenas tochas para iluminar. Chega ao portão.
Ele escora suas mãos no portão. Fecha os olhos por alguns segundos. Abre-os e olha para a mulher que está, agora, a sua frente. Ele dá um passo para trás.
Ela abre o portão. Abre os braços e diz: “Desculpa.”. Uma lágrima cai de seu olho, enquanto um sorriso o estampa.
Ele dá um passo à frente. Abraça a mulher e diz: “Senti sua falta”.
Sexta-feira. Noite. Lua. Estrelas. Ele e ela estão em frente ao prédio azul de três andares, abraçados. Carros e pessoas fazem o barulho noturno da cidade.
Sinto o cheiro do sol na minha pele.
Ele me tateia docemente,
até queimar.
Queimada pelo cheiro do sol,
procuro a lua como vingança.
Ingênua.
O cheiro da lua só existe por causa do cheiro do sol.
Nova espécie
Pedro chegou a casa e estranhou a agitação das pessoas. Tudo era sempre tão
tranquilo naquele ambiente. Estava se perguntando o que poderia ter acontecido.
Mas, como sempre, foi primeiro tomar seu banho e colocar sua roupa de ficar em casa. Para ele isso era um ritual muito importante, o qual não poderia ser pulado.
Terminadas suas ações, foi conversar com os terráqueos com os quais compartilhava o teto.
- Que alvoroço todo é esse? – perguntou Pedro.
-Você não soube? – disse uma das pessoas.
- Soube do quê?
- Um extraterrestre, Pedro! Um extraterreste!
-Hã? - indagou o sujeito com uma expressão confusa.
- Um extraterrestre estava morando na Terra e aqui, na nossa rua, há muitos anos. Ninguém desconfiou de nada até hoje. – disse o terráqueo com um tom mais alto – Muito estranho ninguém ter desconfiado de nada. Será que essas coisas são mais espertas que a gente? Igual naqueles filmes que os ET’s sempre se dão bem?
-Que história é esse de extraterrestre? Explica isso direito, pelo amor! – Pedro estava assustado.
Não houve tempo para explicações. Pelo menos não ali, de imediato. O alvoroço agora estava na rua onde Pedro morava. Havia boatos que eles eram vizinhos. Todos queriam ver quem realmente era aquele ser vindo de outro planeta. Ninguém tinha visto o rosto dele ainda. Apenas os políticos e cientistas que estavam estudando essa possibilidade há muito tempo que sabiam quem ele era. Nada saiu na imprensa, para não terem falsos alardes.
- Aposto que deve ser aquele escroto do Alberto! Eita, ser estranho aquele.
Humano que não deve ser mesmo! – disse um dos moradores da rua.
- Para mim, é Maria. Ela sempre me pareceu muito desconfiada, com seus modos
estranho e silencioso. Ela sempre analisa tudo e todos. Ela sempre parecia estar tramando alguma coisa. - disse outro.
Pedro estava ouvindo todos os comentários e estava confuso, mas até que estava se divertindo com aquela bagunça toda. Divertia-se ainda mais com as tentativas das pessoas em tentar adivinhar quem era o extraterrestre. Ele também tinha palpites, só que guardava para ele.
Todos estavam aguardando as autoridades chegarem com os cientistas para fazerem a captura do ser não terráqueo. Quando os carros se aproximaram da rua, um silêncio foi tomando conta das pessoas. Nenhum palpite mais era ouvido.
Os carros do Governo estacionaram no meio da rua e deles saíram alguns políticos mais importantes da cidade e três cientistas. Eles pareciam cansados, mas ao mesmo tempo, elétricos, animados. A multidão que tomou conta da rua de Pedro nem impressionou aquelas pessoas que estavam mais interessadas em resolver logo o mistério.
- “ET- O Extraterrestre”! Essa situação toda me lembrou desse filme. Cadê a
menininha que ajuda a cuidar do bichinho? – disse um dos moradores com tom de
deboche.
As pessoas ainda não acreditavam na possibilidade de ter um ser não terráqueo
entre eles. A imagem de um extraterrestre era vinda apenas de filmes e livros. Ficção.
Todos de ficção.
- Eu não acredito que tenha gente pensando que tem mesmo um ser bizarro de outro planeta morando na Terra. Quer dizer, né... Gente bizarra por aqui que não
falta... Mas eles são bem humanos, humanos até demais, se é que você me entende-
afirmou um dos moradores da rua para outro.
- Lá vamos nós de novo nesse papo de verdade e não verdade... Deixa os caras
fazerem o trabalho deles e a gente vai descobrir logo se isso tudo é uma piada ou não. – retrucou outro.
Nesse tempo, os políticos e os cientistas estavam se aproximando da casa de
Pedro. Ele e as pessoas que moravam ali já estavam uma encarando a outra e se
perguntando se um deles era o possível ET.
-Boa noite. – disse um dos políticos – Pois bem, temos dados científicos de que
nessa casa, morando entre seres humanos, há um ser que não se encaixa a nossa
espécie. Nossos cientistas afirmam ter certeza disso. Viemos buscá-lo.
“O quê? Como assim? Que história é essa? Vocês estão loucos”. Essas foram
algumas das frases gritadas pelos moradores da casa, inclusive por Pedro.
- É aquele ali! Podem levá-lo. – Disse o político apontando para Pedro.
Pedro quase desmaiou. Aquela teoria para ele era absurda. Ele era bem humano e sabia disso. Como poderia ser um extraterrestre tendo saído da barriga da
mãe dele?
Os cientistas nada comentavam. Concordavam com aquilo, pois os anos de estudos dos três comprovavam muito bem a teoria de Pedro ser um ET.
Todos da rua estavam em choque. Ninguém poderia imaginar que Pedro não fosse humano. Aquilo, para eles, parecia mesmo um absurdo. Não estavam acreditando.
Quando Pedro estava sendo levado para o carro um dos moradores gritou:
- Vai, Pedro! Use algum de seus poderes extraterrestres para fugir. Vai logo!
“Mas que poderes?” Pedro se perguntava. Ele era um humano. É um humano. Quando iam colocá-lo no carro, Pedro sumiu.
-Nossa! Ele é um ET mesmo. Que maneiro, cara!- disse um adolescente que
morava na rua.
Todos estavam mais perplexos. A teoria das autoridades e dos cientistas era mesmo verdadeira. Pedro estava morando entre ele há tanto tempo e ninguém soube de nada.
- Essas criaturas são realmente muito poderosas, hein!? Temos que ficar amigos delas. Quem sabe não rola uma parceria entre terráqueos e ET’s? Seria incrível! –
comentou um empresário que morava na rua.
Todos decidiram ir para suas casas depois daquele circo todo armado. Era verdade sim que havia um ET na Terra. Mas a essa altura ele se encontrava bem longe dali e o do planeta azul.
- Onde estou? Quem está aí? Alguém pode me responder, por favor?
- Calma, Pedro. Você está bem! Não poderia os deixar fazer aquilo com você. Agora vou cuidar muito bem de você e seremos felizes com nossos filhos terráqueos e marcianos. Você já pensou nisso? Será maravilhoso! Criaremos uma nova espécie.
Pedro, já sem estar com os olhos vendados:
- Maria?
Eu amo pré-tempestades.
As árvores gritam como se fossem donas do mundo.
Eles proferem um grito de autoridade,
mas também desespero.
Eles não sabem se a manhã chegará.
É tudo ou nada.
Eles dançam freneticamente com seus galhos.
Eles me convidam para dançar,
mas eu me recuso.
Eles ficam em silêncio ao amanhecer.
Em uma dança sem música,
desliguei-me da saudade.
Mas ela me espreitava,
pronta para tomar os meus passos.
Fiz-me surda e cega.
Sentia seu aroma,
daqueles misturados tudo e com um pouco de todos,
menos de mim.
Teimosa, ela me pegou.
Acabo por me entregar,
entre sorrisos e prantos.
A manga daqui me lembrou você, vovô.
Pensei na manga caída na terra no jardim atrás da casa.
Pensei na minha infância,
uma infância perto da terra graças a você e vovó.
Não pude me despedir do senhor.
Dói.
Queria uma outra manga da árvore que foi cortada porque caía na casa do vizinho.
Parece esperar pelo que não está,
ou pelo que já está despercebido.
Parece se desencaminhar por rotas esburacadas
e empoeiradas.
Espera.
Descaminha-se.
O visível corrói,
e respinga.
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